Pela primeira vez havíamos conseguido juntar todo mundo. Pela primeira vez havíamos conseguido ir para um lugar decente. Pela primeira vez estávamos pagando um hotel fantástico, uma cobertura.
O que acontece que minhas coisas nunca conseguem ficar PERFEITAS, hein?
Sonho demais? Sonho alto demais?
Vou contar como tudo começou.
Chegamos pela madrugada, todos bem cansados para fazer algo além de abrir as malas, juntar apetrechos de higiene, pijama e escolher uma cama para dormir. Enquanto o resto já estava naquele terceiro sono eu ainda me perguntava onde tinha errado por ter que dividir uma cama comigo mesma dessa vez. Essa viagem tinha tudo para ser perfeita, mas na última ele estava lá, tornando tudo diferente.
Pela manhã, depois de um sono meia-boca, acordei e vi que lá fora ainda estava escuro. Na mesa de cabeceira tinha um papel violeta escrito em preto. E esse último repetia-se ao lado das demais camas do local. Aos poucos um a um foi acordando e foi quando eu tive coragem de ler aquelas linhas escuras.
“Bem vindos ao jogo. Por enquanto aconselho que todos preocupem-se em encontrar comida, aumentar a resistência e torcer para que as quests sejam agradáveis.”
WTF? Isso por acaso é uma brincadeirinha pelo meu atual estado de nerdice?
Não. Todos os papéis violeta tinham a mesma mensagem. E nada do dia clarear do lado de fora.
Resolvemos sair e encontramos um cenário bem diferente daquele que imaginávamos ter visto da noite anterior nublada pelo sono. Tudo estava encantadoramente destruído. Casas abandonadas, prédios no chão, vegetação morta e o que parecia ser uma espécie de mortos-vivos passeando vagamente pelo cenário. Mas também tinha o seu ar bucólico e onírico. O ar era azul, as sombras dançavam, a bruma tinha cheiro e cor de lavanda. No meio dos prédios destruídos surgiam flores de todos os tons do espectro de cores frias. Faltava a sensação de segurança, mas parecia que eu já estava acostumada com isso. No último ano eu havia sido adepta da destruição e dos seus toques de beleza.
De repente notamos que nossa primeira quest passava pela derrota do grande grupo de mortos-vivos que vinha em nossa direção. Tentando contê-los descobri que possuia o poder de tirar suas forças pelas mãos, mas meu poder era fraco demais para lutar contra todos eles.
No meio dessa sensação de WOW [o jogo] eis que surge uma criatura muito mais poderosa, muito maior que os demais, cheia de correntes, sua pele era azul. Eu sabia que não estava preparada para aquilo, não na vida real, que vai além dos botões do teclado. E eu já podia ver o rosto maliciosamente sorridente do criador desse jogo.
Então surge do meio das ruínas aquele cara loiro, alto, olhos claros e túnica verde. A única imagem da minha vida associada ao amor. Em alguns segundos ele contém as criaturas, me pega pelo braço e então corremos para o alto através de uma ponte destruída. Esse caminho era iluminado por abajures de todos os tipos e cores.
Quando alcançamos o topo, tudo parecia ter voltado ao normal. Era um local seguro. De repente eu era apenas uma garota, infantil, que podia passar o resto da vida naqueles braços, esquecer do mundo, largar tudo e ainda assim ser feliz.
Caminhamos abraçados até o hotel, onde tentamos procurar pelas chaves do quarto em meio à bagunça.
Depois de um tempo o resto do pessoal acabou nos deixando sozinhos, eu e ele.
Ficamos abraçados durante longos minutos sem dizer sequer uma palavra, somente curtindo nosso reencontro.
Mas eu tive que tomar a iniciativa.
Ele parecia seguro, afinal, aquela era uma situação para a qual ele havia se preparado durante toda a vida [mesmo que intencional], era um campo no qual ele sabia andar muito melhor que qualquer um de nós.
Mas eu tive que tomar a iniciativa [e não fiz isso sempre?].
- Hey, o que vamos fazer agora? Como ficamos nós dois?
- ...
- É estranho e normal te ter aqui do meu lado, não sei o que fazer.
- ...
- O jeito que eu fico quando estou contigo. Só tu é capaz de derrubar esse muro que eu contruí ao meu redor. Só uns minutos contigos e minhas pernas já esquecem por onde eu preciso andar, minhas mãos sentem, minha voz pensa e minha cabeça esquece de usar as pessoas.
- ...
- Não sei como tu faz, mas eu fico sentimental [a primeira lágrima], começo a me importar com tudo, sentir tudo, chorar. Não sei se é melhor pra mim, só sei que aqui dentro parece que tudo de repente funciona.
- Não sei o que a gente vai fazer agora, evitei pensar sobre isso. Esse momento simplesmente aconteceu.
- Sabe por que eu sempre tinha medo toda vez que tu saia da minha casa? Tentando sempre te segurar por lá um pouco mais?
- Fala.
- Eu sempre pensava em como seria minha vida se tu não voltasse. Eu não queria ficar sem ti.
- Mas eu sempre voltava, né?
- Sim, sempre.
- Então acho que não importa se eu saio, tu sabe que eu sempre volto. Tu sabe como as coisas funcionam com a gente.
- Mas e agora? O que a gente faz?
- Vamos ficar juntinhos por enquanto.
E assim nós ficamos, nús, juntinhos, abraçados até a hora em que um de nós tivesse que ir embora.
[Ao som de “A kiss to remembre”, My dying bride].
1.Isso foi um sonho, caso não tenha percebido.
2.Um ano de terapia em duas horas de sono.
3.Resgate do passado.
4.Previsão de futuro?
5.Pode ser baseado na mistura de vários itens da vida real. Com lógica ou não.
6.Me fez pensar o que o muro tinha adiado para o ano que vem.
7.Não sei o que eu faço.
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